Na cidade antiga de Conimbriga, situada em Condeixa-a-Nova (Região de Coimbra), estão as maiores e principais ruínas romanas de Portugal.

São Monumento Nacional há mais de 100 anos, os arqueólogos consideram-na um “lugar mítico” na arqueologia portuguesa, os visitantes são aos milhares. O espaço arqueológico/museológico recebe, em média, cerca de 100 mil visitantes por ano.

Muitos deles, quando exploram o recinto e manifestam assombro com as dimensões das ruínas, provavelmente não fazem ideia que apenas 14% da cidade antiga está escavada. 86% das ruínas permanecem debaixo de terra; casas, ruas, edifícios, artefactos, armas, arte, relíquias ou tesouros, são imensos os mistérios que ali continuam soterrados ao longo dos séculos.

Está em curso uma campanha arqueológica que procura desvendar alguns desses enigmas, incluindo um que continua a intrigar os arqueólogos e que pode ser um dos maiores achados arqueológicos nacionais das últimas décadas: o misterioso teatro de Conimbriga.

O Turismo Centro de Portugal acompanhou essa campanha. Estivemos vários dias ao lado dos arqueólogos no terreno e até participámos nas escavações. Testemunhámos o quotidiano, os desafios, as cumplicidades, as brincadeiras, os desígnios e ambições de uma das profissões mais romantizadas pelo cinema, mas cuja realidade não acompanha a ficção.

A descoberta


Um grito interrompe o som incessante do bater das picaretas na terra e ecoa pelas ruínas de Conimbriga. Instintivamente, os jovens estudantes de arqueologia largam tudo o que têm em mãos – as pás, pincéis, espátulas, picaretas, baldes e carrinhos de mão – e dirigem-se a Sofia Ferreira, que está entusiasmada com a estatueta que acabou de retirar da terra.

“Talvez seja do período do Alto Império”, alguém exclama. “A confirmar-se, deve ter estado enterrada há mais de 1700 anos”, complementa outro colega. Tiram-se fotografias e Sofia sorri, animada, enquanto etiqueta a peça e a insere num saco azul. Mais do que a descoberta propriamente dita, entusiasma-a estar ali, no terreno, a escavar num dos mais emblemáticos sítios arqueológicos do país, a cumprir um sonho de criança.

Sofia nasceu e cresceu em Condeixa-a-Velha, junto às ruínas de Conimbriga. O avô trabalhou lá mais de 30 anos, como vigilante e também ajudante nas escavações luso-francesas (1964-1971), por isso, Conimbriga, para ela, era muito mais do que a habitual visita de estudo da escola primária. Era o seu “quintal”, o espaço onde brincava todos os dias com os amigos. “Para além disso, tenho uma muralha na minha garagem”, afirma, a rir – a povoação foi construída em cima de parte das ruínas – “por isso, faz parte de mim desde sempre, está-me no sangue”.

Quando tinha sete anos, gravou um filme do Indiana Jones que deu na televisão. Viu e reviu a cassete VHS vezes sem conta. À noite, sonhava com todas aquelas aventuras. “Percebi que tinha nascido para ser arqueóloga”. Não foi um sonho imediato, foi sendo sucessivamente adiado ao longo do tempo, até agora. Tem 39 anos e está no segundo ano da licenciatura de Arqueologia na Faculdade de Letras de Coimbra.

“A campanha está a ser surpreendente, estamos a encontrar imenso material que nos dá informações importantes”, afirma o arqueólogo Ricardo Costeira Silva. É o coordenador da presente campanha em curso em Conimbriga. “Este projeto assenta numa parceria entre três entidades”. O Museu Monográfico de Conimbriga – Museu Nacional, o Instituto de Arqueologia da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – onde leciona a disciplina – e a autarquia de Condeixa-a-Nova, “que financiam o alojamento e a alimentação dos alunos”.

A campanha, intitulada CONIMBRIGA MMXX, começou a ser programada em 2019, mas foi atrasada dois anos, por causa da pandemia. Foram para o terreno em Julho de 2022 – altura em que decorre a primeira parte desta reportagem – com dois objetivos.

O primeiro é definir os limites originais da Casa dos Repuxos, um dos símbolos emblemáticos de Conimbriga. Suspeitava-se que a casa, uma autêntica mansão de luxo comparada com a arquitetura contemporânea, era ainda maior, tendo continuidade para norte, sendo toda essa fachada desconhecida até hoje.

O segundo objetivo, mais amplo, é explorar todo o potencial científico e patrimonial do vale norte da cidade, onde existem muitas perguntas que continuam sem resposta.

Neste momento, toda a equipa está concentrada no primeiro objetivo. Vamos conhecê-lo melhor.

A Casa dos Repuxos

É uma casa aristocrática, contruída por alguém que terá tido um considerável estatuto social na cidade. A sua construção data de meados do séc. I d.C., sendo amplamente remodelada na primeira metade do século II.

Está recheada de mosaicos magnificamente preservados, que eram as obras de arte mais valorizadas nas habitações de luxo da altura. Retratam episódios heroicos da mitologia clássica – há um dedicado ao Labirinto do Minotauro – tal como momentos quotidianos da cidade.

Possui imensos compartimentos, incluindo um triclínio, salão com leitos onde os romanos se reclinavam para banquetear em pleno conforto, um ninfeu, antigo santuário consagrado às ninfas aquáticas, com grutas artificiais ou pequenas piscinas cobertas com plantas, flores, esculturas, fontes e pinturas, e um peristilo, um idílico pátio rodeado por colunas e com um jardim interior com luz natural, plantas e água, onde o anfitrião passava os seus momentos de lazer ou recebia os convidados.
Ao longo dos impressionantes 180 metros quadrados deste peristilo, encontra-se um pequeno lago com seis canteiros e 521 repuxos de água, que acabaram por dar o nome à casa.

Esta casa é um exemplo da imaginação e engenhosidade do povo romano, não existindo outra na cidade que rivalize com ela na arte do mosaico, nas pinturas murais e na utilização ornamental da água.

Foi descoberta, acidentalmente, em 1907, tendo a sua escavação ocorrido em 1939. Na altura, foram também encontrados os repuxos, que viriam a ser restaurados, juntamente com os mosaicos, em 1953. Os estudos efetuados permitiram restaurar, “com bastante fidelidade”, o sistema hidráulico original. Quando visitar a Casa dos Repuxos, coloque uma moeda de 50 cêntimos na ranhura junto à entrada principal da casa e deixe-se surpreender.

Em 1991 foi construída a cobertura de proteção que protege os mosaicos e as restantes estruturas dos elementos naturais.

Escavações na Casa dos Repuxos

São 09:30 de uma manhã de julho e a temperatura já se aproxima dos 24 graus. Perspetiva-se mais uma tarde de calor abrasador, como tem estado durante toda a semana, mas nada que desmotive a equipa, visivelmente empolgada. Há 83 anos que a Casa dos Repuxos não era escavada.
Para além disso, os resultados dos trabalhos estão a exceder expetativas, a vários níveis. Há estruturas surpreendentes debaixo da terra.

Essa primeira descoberta não foi fortuita. Previamente, a equipa fez uma sondagem no local, a delimitação de uma zona de escavação para avaliar a sensibilidade arqueológica do sítio. “A sondagem é a estratégia inicial de qualquer trabalho arqueológico”, explica Ricardo C. Silva, salientando que as delimitações são sempre quadradas ou retangulares, “para ter o perfil estratigráfico”.

(A estratigrafia é um ramo da geologia que estuda e classifica, cronologicamente, as sucessivas camadas/estratos rochosos. A sua importância vai ser esclarecida mais à frente.)

A sondagem foi certeira. “A cinco centímetros de profundidade já havia estruturas em perfeito estado de conservação”. Continuaram a escavar e encontraram o que parecia ser o muro exterior da casa. Haveria uma rua ao lado? Onde iria dar? Enquanto pensavam nestas questões, desenterraram outras respostas. Acabaram por deparar com um conjunto de compartimentos e descobrir que a Casa dos Repuxos, afinal, é ainda mais colossal do que se imaginava.

O Buraco

Foram vários os compartimentos encontrados. O que terão sido? A resposta, hipotética, é sempre dada pelos materiais encontrados. “Se encontramos um mosaico, por exemplo, é porque devia ser um quarto ou uma sala nobre”.

Há alguns dias, encontraram uma lareira com alguns vestígios de cinza ao lado, o que induz tratar-se de uma cozinha. “São sempre hipóteses. Neste momento temos uma visão parcelar, só escavando em área é que podemos ter uma visão geral e propor a funcionalidade dos espaços”, diz Ricardo C. Silva.

Num entanto, num desses compartimentos, os indícios permitem avançar já uma hipótese. Era, provavelmente, um dos espaços mais menosprezados na altura na casa. Hoje, para esta equipa de arqueólogos, é um dos mais preciosos.

Escavaram mais de dois metros de terra para lá chegar. E ainda assim, há um corrupio constante de baldes cheios de terra a serem erguidos e carrinhos-de-mão a serem movimentados.

Chamam-lhe o “buraco”. Era a antiga lixeira da Casa dos Repuxos. E é de lá têm saído quantidades incríveis de artefactos arqueológicos.

Lá em baixo, estão Danilo Cruz (22 anos) e André Silva (20), dois estudantes de arqueologia que integram a campanha. Ambos adoravam História e escolheram ser arqueólogos por motivos muito semelhantes. “Gosto mais da vertente do trabalho no campo, de estar em contacto com os materiais”, afirma o primeiro. “Estar em campanha, a pôr as mãos na massa, é o melhor”, refere o segundo.

E não podiam ter escolhido um melhor posto para isso. Já foram encontradas moedas, lucernas decoradas, estatuetas, facas de chumbo, anzóis, agulhas em osso, painéis de estuque pintado e imensa cerâmica.

“Estamos a recolher tanto material que, por vezes, escavamos quase como se estivéssemos a escavar pré-história” afirma Ricardo C. Silva, referindo-se a um trabalho mais minucioso, onde a picareta é geralmente substituída por outras ferramentas, como o pico de mão e o colherim, para melhor garantir a preservação do material encontrado.

“O espólio arqueológico que já obtivemos dá para alimentar, no minimio, três teses de mestrado”, assegura o arqueólogo.

O Pote das Libras

Sempre que efetua escavações em Conimbriga, Ricardo C. Silva costuma ser interpelado pela curiosidade dos populares da região. E há uma pergunta que é recorrente: “Já encontraram o pote das libras?”. A eterna conceção de tesouro que parece perdurar no imaginário popular e que envolve sempre moedas.

O arqueólogo muitas vezes nem responde, limita-se a sorrir. Tal como acontece quando um dos estudantes desenterra uma moeda. “É sempre uma festa, começam a gritar e são logo rodeados pelos outros. Com o entusiasmo, nem sabem bem o que fazer, se limpar, se cotar ou arrumar. Tiram fotografias e enviam aos pais: «Olha só o que acabei de encontrar!». As pessoas valorizam muito as moedas e os próprios estudantes ainda vêm com esse encantamento. Nós desvalorizamos essa importância. Para um arqueólogo, em determinado contexto, um pedaço de cerâmica pode ser tão ou mais importante do que uma moeda”.

A “Vista Alegre” dos Romanos

Um dos estudantes levanta-se do seu posto, agarra num pincel e sacode, com extrema cautela, a terra que está encrostada no fragmento de cerâmica que acaba de encontrar. Aproxima o olhar da peça e examina-a por uns instantes, antes de, finalmente, gritar: “Olha a sigillata!”.

A terra sigillata é um tipo de cerâmica fina de luxo que os romanos usavam nos seus banquetes. “Era a Vista Alegre da época”, afirma o arqueólogo, a sorrir. A sua cor varia entre o laranja e o vermelho, tem um revestimento que lhe dá um brilho peculiar e é geralmente ornamentada.

O arqueólogo no seu gabinete, no Instituto de Arqueologia da UC, mostra-nos uma peça em sigillata

“São achados significativos para eles pois é um dos momentos em que eles conseguem transpor o ensinamento teórico que têm nas aulas para o campo. Esta é uma peça importante, com indicações cronológicas preciosas. As sigillatas estão identificadas e catalogadas com tipologias e cada tipologia é quase como uma moeda, vai-se ao catálogo e vê-se quando foi emitida”.

O arqueológo explica que estas peças não são anónimas e costumam trazer sempre uma sigla que identifica o oleiro que a produziu. E essas oficinas e o respetivo período de laboração estão catalogados.

“Inicialmente eram produzidas na Península Itálica, mas depois sucumbiram à pressão da concorrência das oficinas do sul da Gália. Depois, passaram a vir da Hispânia. E, posteriormente, do norte de África. Como são produções estandardizadas, têm um período de produção muito definido. Ao saber de onde vêm, sabemos quando foi produzida”.

“Mas a moeda está datada. Essa informação não é ainda mais objetiva?”, questionamos.

“Mas perde o contexto cronológico”, diz o arqueólogo. “A moeda não se atira para o lixo, pode andar no bolso da pessoa ou no objeto que lhe servia de cofre durante anos a fio. Isto é louça, parte-se, tem um período de vida limitado, de cinco ou dez anos. Numa casa destas, o proprietário devia ter sigillatas aos pontapés. Vamos imaginar aqueles banquetes no seu triclínico, se calhar partia, quotidianamente, pratos, copos, taças. Essa louça com o seu período de vida mais reduzido, dá-nos essa indicação cronológica mais precisa”.

Quando encontram essas peças, os arqueólogos analisam as suas origens e tipologias e, consequentemente, as suas cronologias. “A mais recente é a que vai datar o espaço”.

O arqueológo explica também que a análise da cerâmica pode oferecer uma “dinâmica do espaço”. Se o compartimento foi aterrado, alterado, reformulado. Quando foi? É o elemento mais recente que responde: “foi depois de”.

“Um historiador tem um documento datado, nós não. São os materiais que nos dão as datas, que nos permitem ir datando esses momentos das construções. Daí valorizarmos mais a peça que nos pode dar a informação que falta. Que nos ajuda a interpretar a funcionalidade do espaço ou a datar o que estamos a escavar”.

Sublinhando a importância de fazer um minucioso cruzamento de todas as informações obtidas e o vasto tempo que essa investigação consome, o arqueólogo esboça um longo sorriso antes de referir: “Pode ser uma ‘seca’, mas encanta-me este trabalho dos materiais”.

O Saco azul do arqueólogo

A poucos metros do local da escavação, num corredor subterrâneo da Casa dos Repuxos, amontoa-se um conjunto de sacos de plástico de cor azul. Tudo o que é encontrado é lá colocado e etiquetado, com informações da proveniência do material.

“Esta etiqueta é fundamental. Se ela se perder, todos estes materiais no saco perdem o seu valor. Só têm valor se encontrados em contexto, caso contrário, é apenas mais um caco, e cacos há muitos aqui em Conimbriga”.

“Caco” faz parte da gíria dos arqueólogos e designa qualquer fragmento de cerâmica encontrado. Outros termos frequentes são “terra estéril” ou “terra do tempo da avó”.

Terra do tempo da Avó

Durante as primeiras escavações neste espaço, em algumas zonas os membros da equipa depararam com “objetos peculiares”, como caricas de garrafas de cerveja, caixas de tabaco, peças de plástico ou até uma moeda de 1948. Não foram descobertas felizes. “É um trabalho ingrato estar dias ao sol a escavar à picareta e depararmos com terra que não interessa”.

A terra que não interessa tinha sido ali depositada durante as escavações da Casa dos Repuxos nos anos 40 e estava repleta de vestígios dos trabalhadores da altura. A moeda, neste caso, foi revelante. Sabe-se que a origem desse “material” remonta a 1948 ou um período posterior.

É o que os arqueólogos chamam de “terra estéril”. É terra do “tempo da avó”, ou seja, do século XX, bastante recente e sem qualquer interesse para os seus propósitos. Ao contrário da “terra fértil”, de onde são colhidos bons frutos arqueológicos.

As diferenças da terra são obtidas pela análise estratigráficas. Cada camada estratigráfica representa um período de tempo e, no contexto das ruínas da cidade, uma ação de construção (como nivelar terreno para colocar alicerces) ou de destruição (como o abatimento do telhado no chão).

“Temos que individualizar cada estrato e, em cada um, os testemunhos recolhidos dizem-nos quando casa foi construída, reformulada ou destruída”.

Essa análise é também fulcral para a natureza multidisciplinar o projeto. “Todos os estratos que identificamos como revelantes, recolhemos e ensacamos com referências em etiquetas para os colegas da arquebotânica, que pegam nesta terra e fazem uma flutuação. Vão flutuar estes sedimentos, tudo o que são sementes e carvões vêm à tona e é através disso que eles podem aproximar-se do conhecimento do que era plantado ou do coberto vegetal que existia há dois mil anos”.

Há várias informações importantes que se obtém nestes processos interdisciplinares, a nível da flora e da fauna de Conimbriga. As conchas de ostras e ameijoas revelam a existência de estuários, a análise das ossadas encontradas revela e quantifica a presença de cabras, vacas, aves, javalis, até animais domésticos, como gatos e cães.

“Estes estudos, por exemplo, permitem averiguar a tendência alimentar da população de Conimbriga em determinados períodos e perceber se houve alterações ao longo dos séculos”.

O espírito arqueólogo

A barba densa não impede a gota de suor de escorrer pelo rosto e alojar-se na t-shirt cinzenta e encharcada de Marcelo Ferreira. São quase 13 horas e a temperatura já ronda os 38 graus, mas não há indícios do jovem de 22 anos querer pousar a pá. “É só mais um carrinho”.

Está no segundo ano do mestrado e escolheu arqueologia porque sempre gostou de história. “A parte prática, não a teórica”. Afirma que nos livros, muitas vezes, obtém-se “a visão das pessoas de classe social mais elevadas”, que tinham a oportunidade de narrar os acontecimentos. “Na arqueologia estamos em contacto com os objetos que as pessoas comuns usavam na altura. Estamos em contacto com o povo comum e trabalhamos e obtemos respostas dos materiais que eles deixaram para nós”.

Está motivado por integrar esta campanha em Conimbriga.“ É um sítio que merece ser escavado e estudado durante muitos mais anos, de forma a perceber melhor o funcionamento de uma cidade que está parada no tempo e que é fundamental para perceber o período romano, não só desta região e do país, como de toda a Península Ibérica”.

Quando, finalmente, o carrinho-de-mão está a abarrotar, a pá e a picareta são atiradas para o chão. Já a caminho do almoço, Marcelo partilha: “É um trabalho sempre duro, mas tem de ser; é importante, uma pessoa está aqui por gosto, nem se cansa”.

Já durante a pausa, Ricardo C. Silva afirma estar satisfeito com esse espírito positivo que sido comum entre toda a equipa.

“Têm estado dias de muito calor e é um trabalho duro. São equipas de três ou quatro elementos, um com picareta, outro com pá, outro com baldes e outro com carrinho-de-mão. Se um para ou se ausenta, afeta o trabalho coletivo. Mas temos visto essa vontade, esse entusiasmo, esse desejo de continuar. Por vezes, tenho de os chamar três ou quatro vezes: ‘está na hora, vamos embora’. Isso revela logo o gosto pela causa e isso é essencial”, afirma o arqueólogo.

Segundo ele, um dos mais evidentes indícios de um bom futuro arqueólogo é a vontade. “Muita vontade. Podem nem ter força física, a maior parte das pessoas é a primeira vez que pegam num instrumento daqueles, uma pá, uma enxada ou uma picareta. Os que vêm de um meio mais rural podem trazer mais vantagem nesse aspeto, embora hoje sejam cada vez menos os jovens que tem contacto com esse tipo de tarefas. Mas se existir vontade, isso sobrepõe-se a tudo. Mais do que ter jeito e ser habilidoso com os instrumentos, tem de se ver o brilho nos olhos”.

Digerida a fruta fresca da sobremesa, a equipa começa a juntar-se. São duas da tarde e o termómetro já assinala os 40 graus. Ricardo C. Silva sugere que não se escave durante a tarde. “Podemos todos ir lavar cacos. Há imensos para lavar”.

Instala-se um silêncio ténue, facilmente fraturado com o peso de uma afirmação convicta. “Não está assim tão mau, eu vou para o campo”. José Ruivo, arqueólogo há 27 anos, 22 dos quais em Conimbriga, levanta-se e segue caminho.

Um a um, os alunos levantam-se também. “Professor, não o vamos deixar ir sozinho”, afirmam, antes de o seguir. Ricardo C. Silva fica a observá-los à distância, com o azul do olhar a transparecer tonalidades preocupadas mas orgulhosas. “É este espírito de equipa que se espera que eles ganhem com esta experiência”.

Durante a caminhada para o local da escavação, conversamos com José Ruivo, um veterano destas andanças que não consegue conter o entusiasmo quando fala de Conimbriga.

“É um lugar mítico na arqueologia portuguesa! Não há neste país um sítio romano algum que que lhe seja comparável”, afirma, convicto. “Considero que poder trabalhar em Conimbriga é a concretização de um sonho de jovem estudante e um privilégio imenso. Costumo afirmar que tenho a felicidade de, profissionalmente, me poder dedicar àquilo que gosto e ainda ser pago por isso”, afirma, sorridente.

Recorda, de forma cristalina, o momento quando veio trabalhar para Conimbriga.
A primeira sensação que teve foi que se tratava de “um sítio de extraordinária beleza”, que transmitia “uma enorme paz interior”, onde até o ar que se respirava “era diferente”.

“Quando alguém me pergunta qual a minha profissão e respondo que sou arqueólogo e trabalho em Conimbriga vejo como, frequentemente, o rosto do meu interlocutor se ilumina com um ar de aprovação e admiração”.

A sua predisposição para ir para o campo tem uma vertente que lhe é especial: O fator surpresa. “Parto sempre sem ideias pré-concebidas, sem saber o que a terra esconde e no processo vejo-me muitas vezes como uma criança pequena ansiosa por descobrir um mistério. Pode soar estranho, mas sinto, por vezes, que a minha atividade profissional me permite manter uma curiosidade e um prazer quase infantis”.

Olha para os jovens que caminham ao seu lado e à sua frente e confidencia, quase a sussurrar, como quem quer partilhar um segredo: “Estou a ver nesta campanha jovens com talento e motivação e não hesito em classificá-los como ‘promessas’ da nossa arqueologia”.

Para além da motivação pessoal e do “brilhozinho nos olhos” de cada aspirante a arqueólogo, José Ruivo destaca também a importância do espírito de grupo. E ele tem uma receita secreta para estimular isso.

As praxes arqueológicas

Num verão da primeira década do novo milénio, uma equipa de arqueólogos estava a efetuar escavações na basílica do fórum de Conimbriga, quando deparou com um osso ornamentado e com a inscrição “MAELO”, um conhecido produtor cerâmico da antiga cidade, amplamente documentado em tijolos, telhas e pesos de tear. O entusiasmo foi geral, falou-se até na possibilidade da peça entrar na exposição do Museu.

O debate prolongou-se algum tempo e, só muito mais tarde, é que se soube que, na realidade, a peça tinha sido forjada e enterrada por José Ruivo, durante a hora de almoço da equipa num dos dias de escavação. “Não foram só os alunos que foram apanhados. A partida enganou, inclusivamente, dois professores universitários da área da Arqueologia”, revela o arqueólogo, sorridente.

José Ruivo explica que esse tipo de brincadeiras são comuns no quotidiano das escavações e que envolvem, normalmente, estudantes de arqueologia em fase de iniciação, embora, por vezes, como no caso acima relatado, o leque de vítimas seja alargado.

“Estas brincadeiras destinam-se a criar bom ambiente. Normalmente são pequenas ‘maldades’, que não se pretendem vexatórias e que frequentemente consistem em introduzir uma ‘peça arqueológica’ forjada com o objetivo de fomentar a confusão”.

Apesar de a metodologia ser recorrente – dissimular na escavação “peças arqueológicas” falsificadas por alguém com habilidade para o efeito e convencer “o feliz descobridor” de que se tratam de objetos da maior importância científica, dignos de figurarem em exposição num museu – há sempre novas vítimas, em todas as campanhas.

José recorda algumas dessas “partidas”:

“Numa outra campanha aqui em Conimbriga, convenci um grupo de estudantes Erasmus da Universidad de Extremadura, nossos estagiários, de que uma conta de colar em vidro, que achei ocasionalmente na rua e lhes coloquei no local onde se encontravam a escavar, eram uma peça de fabrico romano, raríssima, e que tinha que ser imediatamente colocada na exposição permanente do Museu. Ainda consigo ver a cara deles quando o então diretor do Museu, Virgílio Correia, lhes revelou que tinha sido só uma partida”.

“Numa campanha mais recente, mediante tratamento laboratorial – imersão em ácido clorídrico – envelhecemos um amuleto fálico em chumbo, de fabrico recentíssimo, até lhe dar o aspeto de antiguidade. A sua ‘descoberta’ em contexto de escavação foi um sucesso retumbante, de tal forma que foi ‘descoberto’ em duas semanas consecutivas por duas equipas diferentes”.

O presente e o futuro da arqueologia

Inês Rasteiro tinha sete anos e estava a brincar no quintal da casa dos pais, na aldeia de Monte Redondo, em Leiria, quando desenterrou uma moeda. Era uma moeda de 1 escudo, do século XX, mas o achado despertou-lhe inúmeras questões: “A quem terá pertencido? Porque está aqui? Quem a meteu aqui? Com que propósito?”. Foi aí que começou a despertar “o fascínio pela descoberta e pelo questionamento das coisas”.

Anos depois, já no curso de arqueologia (está presentemente a tirar o mestrado na Universidade de Coimbra), apaixonou-se pelas ruínas romanas, sem imaginar que um dia ia estar aqui, a participar numa escavação nas maiores e mais emblemáticas ruínas romanas do país. Tem escavado todos os dias, mas ainda não repetiu a façanha com uma moeda mais antiga. “Quem sabe se num futuro próximo volta a acontecer”, diz, com olhos cintilantes.

Ricardo C. Silva está sempre atento a esse olhar. Não apenas pelo que indicia, mas pelo efeito que tem em si.
“Nós, arqueólogos mais velhos, já estamos tão habituados a encontrar artefactos que já encaramos como algo normal, algo corriqueiro. Mas o brilho nos olhos dos mais jovens, por vezes, parece rejuvenescer-nos”.

Quando os mais jovens encontram algo, ficam empolgados: ‘Professor encontrei qualquer coisa’. “Há aquele entusiamo e vemos a pessoa que éramos há anos atrás. É uma sensação ótima porque o encantamento pela profissão vai-se perdendo um pouco à medida que vamos tendo outras responsabilidades, como burocracias, pedidos de autorização, verbas, relatórios, conclusões. Mas a paixão está lá sempre. Uma pessoa só pode ser arqueólogo se tiver muita paixão pelo que faz”.

A ausência dessa paixão leva a muitas desistências em pleno curso. “Entram, em média, 30 alunos para arqueologia por ano. Cerca de um terço desiste logo no primeiro ano”, diz Ricardo C. Silva. “Vem enganados com o que um arqueólogo faz. Trazem essa ideia romantizada das expedições, das viagens e das aventuras. Depois sentem esse choque inicial com a realidade. Alguns têm a primeira experiência de campo e não voltam mais”.

O arqueólogo explica que os alunos que seguem para mestrado estão conscientes que não vão ter um contrato de investigador no início da carreira. “Vão para o mundo da arqueologia profissional e isso é um choque ainda maior. Passam dias e dias em obras. No nosso país, por vezes penso que só um masoquista é que é arqueólogo profissional. Há um masoquismo latente, mas acima de tudo, uma grande paixão”.

O passado de um arqueólogo


Essa paixão manifestou-se na infância de Ricardo C. Silva, passada na alta de Coimbra. Brincava na rua a saltar terraços e quintais. Um dos sítios que mais o encantava era o criptopórtico de Aeminium. Hoje, é visitável no Museu Nacional Machado de Castro, mas na altura, não.

“Eu e os meus amigos descobrimos um ponto de acesso, pelas adegas de um senhor nosso conhecido. Sorrateiramente, fugíamos lá de baixo e explorávamos aquilo tudo, sozinhos. O espaço, hoje, é arrebatador para um adulto, imagine para uma criança. Exercia um mistério, um fascínio. São túneis? São labirintos? Para onde vão? O sítio tinha algo que mexia comigo e ia ao encontro ao gosto que eu tinha pela História e ao fascínio que sentia por coisas antigas.

Começou por estudar latim e foi sem grande surpresa que acabou por seguir arqueologia, na Universidade de Coimbra.
“Foi um encantamento. Passávamos a vida toda, de manhã à noite, com os colegas, a falar de arqueologia. Não percebíamos nada do assunto, mas falávamos sobre tudo e mais alguma coisa”.

Ricardo C. Silva destaca a quantidade de escavações que se faziam na altura – “Começávamos em junho e acabávamos em Outubro” – e as inúmeras prospeções que iam fazer, voluntariamente, aos fins-de-semana. “Era uma paixão completa, eramos verdadeiramente apaixonados por isto”.

Essa paixão alastrou-se. Apaixonou-se por uma colega de curso, Sara Almeida. Casaram e hoje trabalham juntos.

“A Sara é especialista no registo gráfico. Desenha à escala, pedra a pedra, cada vestígio que encontramos. Ela tem essa valência muito desenvolvida, não só desenha muito bem, como faz isso muito rápido. Demora um dia a fazer o que eu demoraria uma semana”.

Esses registos milimétricos no papel, posteriormente têm de ser digitalizado e tintados no computador, pedra a pedra também. “À noite, estamos ao computador a fazer isto, cada um com o seu portátil no sofá, a ver televisão e a fazer a sua tintagem. Ou então a tentar fazer o puzzle dos cacos encontrados. É assim que passamos os serões”.

Não é de estranhar que o filho, guilherme, 10 anos, esteja envolvido desde sempre na arqueologia. “Temos fotos dele com dois ou três anos, já com o pincel na mão a tirar poeira de ruínas, durante umas escavações na baixa. Tínhamos de estar lá os dois, ele foi connosco, entrou para um buraco e entreteve-se”.

Hoje, “para variar”, está também a participar nas escavações em Conimbriga. Um chapéu com um dragão estampado protege-o do calor abrasador, enquanto manuseia, cuidadosamente, um pincel com o qual limpa a areia e a terra das paredes de um compartimento da Casa dos Repuxos, recentemente descoberto.

“Ele já achou mais piada à profissão”, refere Ricardo C. Silva. “Houve uma fase, não induzida por nós, em que dizia que queria ser arqueólogo como os pais. Mas já passou essa fase. Gosta do trabalho do campo, mas diz ‘os pais passam muito tempo à frente do computador’. Vê aquele trabalho invisível do arqueólogo que mais ninguém vê”.

Esse interesse, por vezes, reacende-se ligeiramente, quando vê filmes do Indiana Jones ou da Lara Croft.

A arqueologia no cinema

Na primeira metade dos anos 80 houve um considerável aumento na procura de cursos de arqueologia nas universidades americanas e europeias. Essa subida meteórica não foi fruto do acaso.

Em 1981, estreia “Os Salteadores da Arca Perdida”, que apresentou e consolidou Indiana Jones como o arqueólogo mais célebre da sétima arte. O filme foi um sucesso em todo o mundo, arrecadando 389 milhões de dólares nas bilheteiras dos cinemas. O imaginário popular foi conquistado pelas aventuras de Dr. Jones pelo mundo, explorando selvas exóticas, cidades antigas e templos misteriosos em busca de tesouros e artefactos preciosos.

“Indiana Jones e os Salteadores da Arca Perdida” (1981), de Steven Spielberg

“Uma geração inteira foi inspirada pelo filme a tirar arqueologia nas universidades”, afirmou Fredrik Hiebert, arqueólogo da National Geographic Society. “Esse impacto está documentado estatisticamente, basta verificar o número de estudantes de arqueologia antes e depois do filme. Alguns dos mais célebres arqueólogos do mundo confessam que Indiana Jones foi a centelha que lhes despertou o interesse inicial pela área”.

Dr. Jones durante uma das suas aulas de arqueologia, no filme “Os Salteadores da Arca Perdida” (1981)

Muitos profissionais da área rapidamente desmistificaram essa noção romanceada do quotidiano arqueológico que o filme imprimiu. Winifred Creamer, do Departmento de Arqueologia da Universidade de Illinois afirmou que a personagem caminha numa “fronteira muito ténue entre um arqueólogo e um salteador”. O próprio Hiebert fez questão de sublinhar: “Nós não procuramos tesouros, procuramos conhecimento. Esse é o nosso ouro”.

“Indiana Jones e o Templo Perdido” (1984), de Steven Spielberg

No entanto, o mundo estava cativo desse conceito emocionante do aventureiro de chapéu, casaco de couro e chicote, em busca de artefactos perdidos em destinos distantes e o sucesso do filme motivou não apenas duas sequelas ainda nessa década – “O Templo Perdido” (1984) e “A Última Cruzada” (1989) – como uma enxurrada de filmes do género, como “Em Busca da Esmeralda Perdida” (1984), “A Jóia do Nilo” (1985), “As Minas do Rei Salomão” (1985), “Caminho de Fogo” (1986) ou “A Cidade Perdida do Ouro” (1987). Já em 2008, surgiu a quarta aventura de Indiana Jones, com “O Reino da Caveira de Cristal” e em 2023, 42 anos depois, vai estrear o quinto filme.

Uma dessas infâncias inspiradas pelas aventuras de Indiana Jones é a de João Lousada, um brasileiro de 25 anos que atravessou o Atlântico para tirar arqueologia na Universidade de Coimbra e que integra a campanha de Conimbriga.

Pousa os baldes de terra por uns instantes, antes de partilhar que tinha 13 ou 14 anos quando viu o filme pela primeira vez. “Foi o meu primeiro contacto com esse tipo de mundo, uma criança vê aquilo e fica maravilhada. Mas arqueologia a sério não tem nada a ver, não tem chicote nem nada”, diz, a rir.

Sempre teve interesse pela História, mas não lhe agrada estar fechado numa biblioteca, sente-se mais atraído pelos materiais e pelo trabalho de campo, “a descobrir como as pessoas viviam. Isso fascina-me!”.

Optou por estudar em Portugal pela “história profunda” do país. Tem predileção pelo período romano, pela civilização fenícia e pela época medieval. A sensação de integrar uma escavação em Conimbriga é significativa: “É um sítio emblemático na arqueologia portuguesa, tem um grande historial de investigação, fazer parte deste processo é um prazer muito grande”.

Lavar os cacos

Algures por baixo do edifício do Museu Monográfico de Conimbriga está uma estação de tratamento e conservação dos achados. É aqui que se “lavam os cacos”, nas horas de maior calor. As equipas fazem turnos e, neste momento, estão cá a Inês Rasteiro, a Diana Antunes e a Sofia Ferreira.

Junto à torneira está um tabuleiro com diversos artefactos encontrados, incluindo a estatueta que Sofia desenterrou.

“A limpeza é a primeira tarefa após a receção dos materiais em laboratório”, informa Ricardo C. Silva. “O objetivo é simples: remoção de terra ou outras substâncias que não permitam observar todas as particularidades da superfície dos objetos”.

O arqueólogo explica que este processo, por vezes, assemelha-se a “uma nova escavação”, pois vão-se pondo a descoberto certas particularidades e pode revelar-se a importância de uma peça que à partida parecia ser apenas mais um caco. “Um fragmento cerâmico pode ser um testemunho mudo quando chega ao laboratório. O estudo laboratorial, não apenas a lavagem mas também todo o conjunto de estudos e análises que se seguem, podem torná-lo eloquente”.

Posteriormente, todos os materiais lavados são colocados a secar, no exterior. Depois é efetuada a triagem, com uma seleção dos materiais, individualizando o que é cerâmica comum, cerâmica importada, estuques, fauna, material construção, vidros e até mármores. “Algumas casas, para além do estuque pintado, tinham revestimento a mármore, o que induz a riqueza dos seus proprietários”.

Conclusões da primeira campanha

A primeira campanha arqueológica do projeto CONIMBRIGA MMXX terminou no final de julho e revelou surpresas “muito interessantes”, alicerçou ambições futuras e deixou entreaberta a porta para uma potencial descoberta de elevado valor patrimonial para a cidade antiga de Conimbriga.

A surpresa foi o prolongamento da planta da Casa dos Repuxos. Sabe-se agora que é ainda maior do que se estimava e que a fachada norte da casa sofreu várias reformulações entre os séculos I e III. “Colocámos os compartimentos à vista. Alguns foram transformados num corredor, que acabou, posteriormente, por ser bloqueado e entaipado”, informa Ricardo C. Silva.

As cinzas que tinham sido encontradas e que se pensavam serem provenientes da lareira de uma cozinha indiciam, afinal, algo ainda mais interessante. Ao alargar a escavação cinco metros para norte, foi encontrado um forno de dimensões consideráveis.

“Neste momento, temos motivos para interpretar que se trata de um praefurnium, o local onde se encontravam as fornalhas que alimentavam as termas romanas”, indica o arqueólogo. Fica assim aberta a possibilidade da Casa dos Repuxos incluir também termas privadas.

Um feito considerável materializado na presente campanha foi uma prospeção geofísica de toda a imensa área da cidade – 18 hectares – que se encontra por escavar.

Conimbriga (P2Produções – Condeixa-a-Nova)

Este método, com recurso a georadar, permite indiciar estruturas da cidade que permanecem desconhecidas e enterradas até hoje.
“As máquinas registam, magneticamente, a resistência que existe ao entrar na terra. Essa resistência acusa a existência de alguma coisa, algo mais rígido do que terra. É denominado uma anomalia”, explica o arqueólogo. “Esta extensa análise de toda a cidade permitiu-nos obter um mapa de anomalias”.

Interpretar essas anomalias é um desafio. “É quase uma ciência do oculto”, brinca o arqueólogo. “Pode ser um muro, um pavimento, uma parede, uma canalização, ou simplesmente um afloramento rochoso”. No entanto, é um desafio extremamente valioso que ajuda a equipa a decidir para onde levar e concentrar a sua investigação e as suas sondagens iniciais de diagnóstico.

“As informações obtidas com estes trabalhos geram um documento que vai ser incontornável no estudo de Conimbriga nos próximos anos. Décadas, talvez”.

Algumas dessas anomalias capturaram a atenção de toda a equipa. Pode desvendar um mistério que dura há décadas nestas ruínas. Uma possível localização para o teatro de Conimbriga.

As ruínas da imaginação

Passear pelas ruas das ruínas de Conimbriga é um (intenso) exercício de imaginação. Envoltos no silêncio daquelas pedras milenares, basta um pequeno passo mental para olhar em volta e sentir o seu quotidiano antigo. Ouvir o som da cidade de outrora, o rumor das palavras nas ruas, o barulho dos cascos dos cavalos nas lajes de pedra, a melodia de uma cítara que alguém toca num peristilo, o ruído distante de espadas a tilintar.

Ensaio de visualização de Conimbriga no séc. II d.C. (Jean-Claude Golvin)

Olhar para as paredes e colunas do que já foram casas e imaginá-las no seu apogeu. Imaginar as expressões de assombro que os forasteiros faziam perante a monumentalidade do fórum ou do anfiteatro. Imaginar o ambiente da cidade de noite.

Imaginar o som trovejante dos espetadores no anfiteatro, durante as lutas dos gladiadores.

Ou então imaginar a tensão que se sentiu quando começaram a chegar à cidade notícias do declínio do Império e do início das invasões bárbaras. “Será que eles vão chegar aqui?”. Quantas interrogações dessas terão sido feitas, enquanto se observava o horizonte?

A ansiedade que acompanhou a decisão de fortificar a cidade com urgência. O olhar e o sentimento dos habitantes ao contemplar o sacrifício dos edifícios públicos para obter pedra para erguer a muralha.

O que terão sentido os proprietários das casas nobres, hoje conhecidas como a Casa dos Esqueletos, a Casa da Suástica e, sobretudo, a Casa dos Repuxos, ao saber que estas iriam ficar desprotegidas, fora da muralha?

A chegada das notícias da iminência de um ataque.

O primeiro olhar da população perante a chegada dos suevos em 465.

O pânico, o saque, a destruição.

A tragédia que se abateu sobre a Casa de Cantaber, um autêntico palácio com os seus 3.260 metros quadrados, 40 compartimentos e até um hipocausto, um engenhoso sistema em que o ar aquecido numa fornalha circulava sob o pavimento e pelos tijolos perfurados colocados no interior das paredes. O “aquecimento central romano”.
Cantaber era o principal aristocrata da cidade e foi assassinado na sua própria casa pelos Suevos. A sua mulher e os seus filhos terão sido raptados e vendidos em terras distantes como escravos.

Ou então, durante as caminhadas pelas ruas e casas das ruínas de Conimbriga, imaginar tudo o que continua oculto sob os nossos passos.

O que vemos é apenas 14% da cidade. E “apenas isso” permitiu encontrar os 1281 artefactos que se encontram em exposição permanente no museu e os quase 15 mil que existem em reserva, para além de um número não contabilizado de outras peças ou fragmentos, recolhidos em escavações mas não passíveis de serem inventariados, acondicionados em mil contentores. O que continuará por descobrir nos restantes 86% da cidade soterrada?

Viagem no tempo

Foto: Terras de Sicó

A imaginação que é estimulada por essas visitas pode ser confrontada com uns “vislumbres de realidade”. Ou de recreação da realidade.
Todos os verões, Conimbriga recebe aquele que é considerado o maior evento de recreação histórica da vida romana realizado em Portugal. Intitulado “Condeixa – O vislumbre de um império” e organizado pela Câmara Municipal de Condeixa-a-Nova, o certame conta já com sete edições e, em 2022, recebeu mais de 12 mil visitantes.

Sempre com as ruínas como palco, há teatro de rua, lutas de gladiadores e duelos de legionários, rituais e cerimónias romanas, música ao vivo, danças, trabalhos de artesãos, espetáculos de falcoaria, entre inúmeros outros eventos de animação. Há ainda a possibilidade de participar em experiências únicas, como visitas guiadas noturnas às ruínas.

“Decorrido no cenário vivo das Ruínas de Conimbriga, o evento atingiu uma projeção significativa e é nossa aposta em próximas edições vê-lo reconhecido como uma das maiores recreações históricas do país, dignificando a importância daquele sítio romano”, afirmou Nuno Moita da Costa, presidente da Câmara de Condeixa-a-Nova.

O Anfiteatro de Conimbriga

Atravessamos três enormes túneis de pedra. São arqueados e há buracos nas rochas que os interligam. O ar é fresco e húmido aqui em baixo. Há dois mil anos, eram gladiadores que o respiravam, expectantes, talvez, com o que os aguardava do outro lado: A arena do anfiteatro de Conimbriga.

Anfiteatros são arenas ovais ou circulares, rodeadas de bancadas a céu aberto. O nome tem origem no grego antigo, “amphitheatron”. “amphi”, “em ambos os lados” e “théātron”, “lugar de visionamento”. “Visto de ambos os lados”, era apenas uma das particularidades que diferenciavam os espetáculos nos anfiteatros. A outra, muito mais vasta, eram o tipo de espetáculos que lá aconteciam.

Gladiadores
Lutas de gladiadores (geralmente eram prisioneiros de guerra) armados com lanças, espadas ou redes e forquilhas, até à morte, seguidas com imenso fervor nas bancadas, sendo os vencedores bastante valorizados e até idolatrados.

AD Bestias
Execuções onde os condenados iam nus e indefesos para a arena, sendo mortos por animais selvagens, geralmente leões ou tigres. Este tipo de execução costumava ser aplicada prisioneiros, escravos em fuga ou cristãos.

Venatio
Matança de animais selvagens provenientes de zonas exóticas do império (África e Médio Oriente), como rinocerontes, hipopótamos, elefantes, girafas, leões, leopardos, ursos, crocodilos, bisontes, tigres, panteras, hienas ou lobos.
Por vezes, a caçada era transformada em duelo, com um gladiador especializado em luta contra animais selvagens – bestiarius – a enfrentar um determinado animal.
Em Roma, no ano 107, o imperador Trajano comemorou vitórias militares com 123 dias de sangrentos espetáculos, que envolveram 11 mil animais e 10 mil gladiadores.

Naumachias
Espetáculos onde as arenas dos anfiteatros eram inundadas para recriar batalhas navais. As batalhas podiam ser encenadas ou reais, com prisioneiros que tinham de lutar até à morte nas suas embarcações.
No ano 52 DC, o imperador Claudius organizou uma naumaquia épica, que envolveu 100 barcos e 19 mil homens.
Até hoje, não há registos ou indícios arqueológicos que expliquem a engenharia envolvida no processo de inundar os anfiteatros.

Presentemente, há 230 ruínas de anfiteatros romanos espalhadas pela vasta área do antigo Império Romano. Na província da Lusitânia só são conhecidos cinco. Dois em Espanha (Mérida e Caparra) e três em Portugal, Ammaia (Marvão), Bobadela (Oliveira do Hospital) e Conimbriga.

Escavar o anfiteatro

“Estas são as entradas monumentais de uma das galerias centrais do anfiteatro”, explica Ricardo C. Silva, aludindo aos três tuneis onde nos encontramos. “São fantásticas, só por si são um sítio de visita obrigatório e, curiosamente, muita gente nem sequer sabe que existe. Toda a gente que trago aqui, abre a boca de admiração”. E essa está a ser a reação dos cinco alunos que o arqueólogo trouxe, durante um intervalo de escavações, para conhecer o local.

Informa que, do lado oposto onde nos encontramos, já se fizeram sondagens que confirmaram a existência de entradas idênticas, com os três arcos igualmente preservados e com a mesma dimensão.

“O que está aqui dá-nos a perceção do que pode estar por baixo de terra. Dá-nos quase a certeza que temos o alinhamento da arena e o limite do podium (muro que circunda a arena), perfeitamente definido. O muro, em princípio estará lá, enterrado. A dúvida que subsiste são as bancadas, qual será o seu nível de preservação e quanta pedra terá sido retirada durante a construção da muralha”.

O arqueólogo explica que o processo de escavação e valorização do anfiteatro é um desígnio que tem sido adiado porque há imensas casas, currais e terrenos de Condeixa-a-Velha que se sobrepõem às suas ruínas e que ainda não são propriedade do estado. Essa aquisição é o primeiro passo a percorrer, numa caminhada que se prevê longa.

“O sonho é integrar esta zona no circuito de visita do museu. Possibilitar que as pessoas possam começar pela Casa dos Repuxos, passar pelo aqueduto, pelo viaduto, pelo tal edifício público que poderá ser o teatro e terminar a sua visita aqui no anfiteatro. Ou vice-versa. Este projeto é um corredor natural entre as ruínas e a aldeia. Pretende envolver e aproximar a comunidade”.

Para além da referida aquisição, os desafios, segundo o arqueólogo, são vários. “Implica a retirada de milhares de toneladas de terra e um esforço financeiro assinalável, com recurso a meios mecânicos de escavação e compromissos de restauro e conservação permanente. É um sonho distante. Mas já esteve mais longe”.

Sinais teatrais

Os teatros romanos, contrariamente aos anfiteatros, tinham uma forma semicircular. Eram bastante ornamentados, com o palco e a frente do cenário decorados com pórticos e colunas.

As bancadas (cavea) eram altas o que, juntamente com a estrutura em semicírculo, favorecia a acústica. Costumavam ser usados para encenações de peças gregas e romanas, pantomimas ou eventos corais.

O Teatro de Bosra, no sul da Siria, é um dos teatros romanos mais bem conservados do mundo. Esteve engolido pelas areias do deserto até aos anos 50, quando ocorreu a escavação arqueológica.

Em Portugal, só há dois teatros romanos identificados, em Braga e em Lisboa. Conimbriga pode vir a ser o terceiro.

O primeiro indício da presença do teatro em Conimbriga surgiu com a análise topográfica do terreno. “É uma estrutura que, com o seu palco e bancadas, topograficamente, é semicircular. Há ali um espaço que, através da fotografia aérea, faz esse semicírculo”, afirma Ricardo C. Silva.

“Depois, temos um anfiteatro e em várias cidades romanas e, inclusivamente, na capital da Lusitânia, Mérida, há aquilo que é designado como o quarteirão dos jogos, onde o teatro ladeia o anfiteatro. Para além disso, a galeria abobadada a que chamamos viaduto, é muito semelhante em termos arquitetónicos, ao que chamamos de aditus, uma das entradas típicas dos teatros”.

Espaço recriado para espetáculos em Conimbriga, com o palco inserido nas ruínas de termas romanas

O arqueólogo explica que foram também efetuadas medições do terreno, tendo sido projetados alguns teatros conhecidos em Espanha naquele espaço. “As medidas batem certas”.

Todos esses indícios cresceram ainda mais quando foram efetuados os trabalhos de geofísica.

“Indica-nos anomalias com essa curvatura semicircular, tal como a existência de muros perimetrais, com metro e meio de largura, o que induz tratar-se de um edifício público. O único edifício público que falta identificar na cidade é o teatro”.

O futuro de Conimbriga

“Uma descoberta desta natureza, representaria de imediato, um acréscimo significativo de conhecimento sobre o urbanismo da cidade antiga e um elemento adicional, para enriquecer consideravelmente a futura museologia deste imenso campo arqueológico”, afirma Vítor Dias, diretor do Museu Monográfico de Conimbriga, relativamente à possibilidade de encontrar o teatro.

Estamos a percorrer o imenso planalto da muralha, a oeste da cidade. É uma zona não visitável e que ainda está por escavar. Ninguém sabe o que existe por baixo deste denso manto de erva. Por enquanto.

“Os recentes trabalhos de geofísica neste planalto e no vale norte criam a possibilidade de obter um documento com uma metodologia adequada ao bom planeamento dos trabalhos de campo no futuro”, assegura Vítor Dias. “As valências deste campo arqueológico permanecem ‘intactas’ e ainda numa fase ‘embrionária’ do desenvolvimento de todo o seu potencial patrimonial, científico e turístico”.

Nesta zona das ruínas, o silêncio é total. Só se houve o vento e o ondular da vegetação. Alcançamos e escalamos o vértice da muralha. A vista impressiona.

Vítor Dias diz-nos que está nos planos futuros criação um miradouro nesta zona, conhecida como “bico da muralha”. “É o local certo para demonstrar a dimensão territorial e centralidade geográfica que o planalto proporciona”.

Outro dos planos é tornar Conimbriga um portal para um melhor entendimento da Região Centro. “É uma cidade antiga com inúmeras ‘vidas’: pré-romana, romana e pós-romana, cuja centralidade geográfica e interação com o território é estruturante para um integral entendimento de toda a Região Centro, na sua relação entre o Atlântico e a Meseta Ibérica, o norte e o sul, a cultura orientalizante do Mediterrâneo e a cultura europeia”.

Mas os desígnios não ficam por aqui. “Os planos são ambiciosos e proporcionais à escala do sítio arqueológico”, afirma o diretor, sorridente.

Para além de dar continuidade à “excelência da investigação arqueológica” nas campanhas no terreno e tornar visitáveis as zonas acima referidas, Vítor Dias salienta a necessidade de restaurar a muralha do Alto-Império de Conimbriga, que tem dois mil anos, tal como proceder à investigação e escavação do anfiteatro, localizado junto à povoação de Condeixa-a-Velha.

“Essas são as prioridades do Museu nas próximas décadas”, afirma o diretor, sublinhando que Conimbriga “continuará a ser nas próximas décadas e séculos, um excecional exemplo dos benefícios que o investimento em investigação e património proporcionam para as gerações vindouras”.

Desenterrar o teatro

A segunda fase da campanha finalmente chegou. Estamos no final de setembro e os estudantes de arqueologia estão ansiosos por voltar à campanha e a Conimbriga. Mas o outono também chegou e trouxe com ele a chuva.

A chuva não impediu a escavação mecânica. Uma escavadora retirou algumas toneladas de terra até atingir estruturas arqueológicas, que estavam a cerca de três metros de profundidade.

“Isto validou os dados da geofísica, que assinalaram anomalias a uma profundidade assinalável”, afirma Ricardo C. Silva. “Essas anomalias são estruturas, resta agora saber de quê”.

Essa resposta irá surgir com a escavação manual. No entanto, esse trabalho já não é viável com chuva. Há uma semana inteira calendarizada para a escavação. Expectante, a equipa consulta as mais variadas plataformas de previsão meteorológica diariamente. Olham para o céu, à espera de um erro de diagnóstico que não surge. Um a um, os dias foram passando e a chuva não deu tréguas.

Já estamos quase a entrar em Outubro quando há uma aberta no tempo. Já sem a disponibilidade integral da equipa, que entretanto regressou aos seus compromissos académicos, três arqueólogos decidem ir para o terreno. Ricardo C. Silva, José Ruivo e o diretor do museu, Vítor Dias, agarram nas pás e picaretas e descem ao buraco de três metros de profundidade, em busca das respostas adiadas pelo clima.

“A validação destas hipóteses dependem não só da aplicação de metodologia arqueológica bem escrutinada, mas também de variados fatores, por vezes imprevisíveis”, afirma Vítor Dias.

Ricardo C. Silva, Vítor Dias, José Ruivo

O trio passa o dia a escavar – de tempo a tempo, deparam com os habituais “cacos”, suficientes para encher um balde, e até ossadas – e coloca à vista dois muros (ou paredes) de dimensão considerável.

Nós decidimos participar. Durante algumas horas, substituímos o bloco de notas e a máquina fotográfica pela picareta e testemunhamos, em primeira mão, o esforço hercúleo destas tarefas. O duelo persistente contra a rigidez do solo, as viagens constantes com baldes a abarrotar, o ardor dos músculos, a profundidade que não parece ter fim.

E, sobretudo, partilhamos aquela vontade de ignorar tudo isto e continuar a escavar, ansiosos por saber o que vamos encontrar no próximo mergulho da picareta naquele solo milenar.

“Temos estruturas, que estão muito mais profundas do que pensávamos, e é impossível, neste momento, abrir em área para obter mais respostas. Há indícios mas não podemos afirmar já que é um edifício público”, afirma Ricardo C. Silva. “Não conseguimos validar. Nem invalidar”.

“A descoberta de novos dados arqueológicos é sempre um momento de grande júbilo e representa um grande privilégio para qualquer arqueólogo”, diz Vítor Dias, sublinhando de imediato: “Mas isso é sempre o culminar de inúmeras e prolongadas etapas preparatórias”.

Apesar dos contratempos, há otimismo no ar. “Tudo isto indica-nos que os levantamentos da geofísica são credíveis”.

No verão de 2023 vão voltar ao terreno, já com a equipa completa.

Ao todo foram 20 alunos de arqueologia que participaram nesta campanha (Ana Pereira, André Silva, Beatriz Jorge, Danilo Cruz, Diana Antunes, Diana Marques, Inês Rasteiro, João Losada, Marcelo Ferreira, Pietro Mack, Sofia Ferreira, Rúben Mendes, Luís Ruivo, Kely Veloso, Raquel Mendes, Joana Araújo, Alexandra Simões, Márcio Madeiros, Andreia Santos e Lara Mateus).

Durante toda a campanha, o arqueólogo manteve um ritual com eles. Todos os dias saíam daqui e paravam num café de Condeixa-a-Velha, “o único da terra”, onde Ricardo C. Silva fazia questão de pagar uma cerveja a todos. “Aproveitamos esse momento para fazer um balanço do que foi feito, programar o dia seguinte, perceber como está a correr, se estão a gostar, as suas preocupações, etc. É importante criar esses momentos de convívio e de memórias que eles levam para sempre”.

Foi num desses momentos de convívio que Sofia Ferreira descobriu que o seu achado arqueológico foi, afinal, fruto de uma elaborada partida. Tinha sido enterrado na véspera, após ter sido “envelhecido“ com terra e argila húmida.

“Foi uma partida muito bem-feita e elaborada, não desconfiei de nada e achei um piadão”, afirma Sofia. “Hoje, esse objeto faz parte da decoração dos móveis da minha sala de estar”.

Ricardo C. Silva tem outro ritual, mais pessoal. É comum regressar sozinho às ruínas ao fim-do-dia. “O silêncio, a brisa, as cores do entardecer, é um momento ótimo para estar no campo”. É lá que está agora. Ora a limpar poeiras das ruínas, ora em contemplação.

“Não acho que Conimbriga, enquanto cidade romana, seja mais relevante por ter um teatro. Mas é esta ânsia por desvendar um mistério. Tem ou não tem?”.