No início dos anos 20, George Mallory foi o primeiro europeu a tentar escalar o Monte Everest. Na altura, acreditava-se que tal façanha era impossível, por isso o alpinista britânico foi bombardeado com perguntas. De onde vinha esse apelo? Porquê subir à montanha mais alta do mundo? Deu sempre a mesma resposta: “Porque ela está lá”.
As paisagens do Centro de Portugal estão recheadas de montanhas, destinos imponentes e deslumbrantes, com um encanto que varia consoante as estações. Sejam pintados de branco ou de verde, nos seus cumes sentimo-nos no topo do mundo, damos liberdade ao olhar para se perder na distância, enquanto o sol, as nuvens e as estrelas parecem estar ao nosso alcance.
Reunimos aqui as montanhas mais altas de todas as Regiões do Centro de Portugal. Algumas polvilhadas com Aldeias do Xisto, que são um destino Dark Sky, cuja certificação internacional Destino Turístico Starlight garante excelentes condições de visibilidade, transparência e escuridão do céu. São o melhor sítio para se aproximar das estrelas.
Seja de mochila às costas, de carro ou de mota; seja por um desejo de conquista ou um sentimento de aventura e exploração; seja em busca de um espaço cheio de silêncio e serenidade para introspeção ou de uma beleza avassaladora para inspiração; seja qual for o motivo, estas montanhas estão lá.
BEIRAS E SERRA DA ESTRELA
Serra da Estrela (1993 m)
Esta é a montanha mais alta de Portugal continental, o seu ponto mais elevado – denominado Torre – soma 1993 imponentes metros de altitude. A serra tem, inclusivamente, cinco picos acima dos 1500 m: Alto da Pedrice (1758 m), Poios Brancos (1704 m), Santinha (1595 m), São Bento (1530 m) e Taloeiros (1517 m).
Há muito para explorar na Serra da Estrela. No verão, nade nas águas puras e cristalinas da Praia Fluvial de Loriga, alojada num planalto da montanha; no inverno, fotografe a cascata gelada do Poço do Inferno. Experimente ski ou snowboard na única estância de ski do país. Se gosta de praticar escalada, tem aqui um dos melhores spots da Península Ibérica, uma parede vertical de 500 m chamada Cântaro Magro. Escolha o ângulo certo, tire o telemóvel do bolso e obtenha uma selfie memorável.
Certifique-se que traz as botas de caminhada, pois tem imensos trilhos pedestres para fazer e muitas Aldeias de Montanha para visitar. Num desses trilhos vai poder atravessar um vale glaciar, encher o cantil com água pura do Zêzere e alcançar o cume da Serra da Estrela. É o trilho Rota do Vale Glaciar (PR6 Manteigas), com 17 quilómetros de extensão e dificuldade moderada, que vai da Vila de Manteigas à Torre.
REGIÃO DE COIMBRA
Serra do Açor (1418 m)
A Serra do Açor é a quinta montanha mais alta de Portugal continental. O seu ponto mais alto é o Pico de Cebola, com 1418 metros de altitude. Tem outros pontos de grande elevação, como o Monte do Colcurinho (1242 m), o Alto de São Pedro (1341 m) ou o Cabeço do Gondufo (1342 m) – perto do qual nasce o rio Ceira – todos com vistas de cortar a respiração para vales e cordilheiras.
Explore a mata da Margaraça, uma floresta autóctone recheada de carvalhos, castanheiros, cerejeiras, freixos e loureiros, onde se podem encontrar 74 espécies de cogumelos e 240 espécies de borboletas. Ao percorrer um dos seus trilhos, quando deparar com a mancha lilás das urzes, saiba que é o seu polén que dá um paladar tão peculiar ao mel da Serra do Açor.
Nessas caminhadas, se tiver sorte, poderá fotografar um açor, a ave de rapina que deu nome à serra.
Visite também a Fraga da Pena, uma surpreendente queda-de-água num cenário cheio de natureza, onde a água abre caminho por entre a vegetação e a rocha e se despenha numa pequena lagoa, formando uma cascata de 20 metros de altura.
Pernoite numa das cinco Aldeias de Xisto desta serra – Aldeia das Dez, Fajão, Vila Cova de Alva, Benfeita e Sobral de São Miguel – onde lhe esperam noites estreladas Dark Sky.
Serra da Lousã (1205 m)
Na mesma região, pode visitar também a Serra da Lousã. No seu ponto mais elevado, no Alto do Trevim, pode usufruir de um baloiço panorâmico enquanto a sua vista mergulha nas montanhas.
Explore os bosques da serra, que servem de refúgio natural de mais de três mil veados e corços, com um pouco de sorte conseguirá fotografar um. Vai dar imenso uso à máquina fotográfica nas paisagens fantásticas atravessadas pelos trilhos pedestres que levam a 12 encantadoras Aldeias do Xisto: Aigra Nova, Candal, Casal Novo, Chiqueiro, Ferrareia de São João, Pena, Aigra Velha, Casal de São Simão, Cerdeira, Comareira Gondramaz, Talasnal. Em todas elas, já sabe que irá usufruir de noites de céu límpido e polvilhado por estrelas.
VISEU DÃO LAFÕES
Serra de Montemuro (1381 m)
Para além de ser a oitava montanha mais alta de Portugal continental, Montemuro é uma serra recheada de histórias, lendas e vestígios arqueológicos.
Num dos seus pontos mais altos (1213 m), encontram-se as ruínas da Muralha das Portas do Montemuro, um antigo castro de um povoado da Idade do Ferro que foi também usado como fortaleza pelos romanos e por D. Afonso Henriques, na altura da reconquista. Está abandonado desde o século XIII, mas ainda lá estão muitas das pedras que definem as antigas linhas das muralhas, onde é possível imaginar o vasto território contemplado pelos guerreiros nos dias e noites de vigia.
Se subir mais um pouco, no cume – denominado por Talegre ou Talefe – é possível avistar montanha longínquas como o Gerês e a Serra da Estrela.
Dê continuidade à aventura no trilho do Percurso das Minas (PR2 Castro Daire), onde poderá explorar as ruínas das minas de Moimenta de Cabril e aventurar-se nos antigos túneis onde se extraía o volfrâmio e o estanho durante a Segunda Guerra Mundial.
Se a sua sede de exploração continuar insaciada, saiba que nesta montanha nasce um dos rios mais limpos da Europa, o Rio Bestança, que corre, livre e selvagem por zonas ricas em fauna e flora. No dia certo poderá encontrar, mas suas margens, lontras, ginetos, texugo, gatos-bravos, raposas ou javalis. À noite, não estranhe se ouvir o uivo dos lobos, que são abundantes nesta serra.
Por serem palco de inúmeras lendas que lhe dão um ambiente místico, a Serra de Montemuro, juntamente com as serras da Freita (1100 m), Arada (1.057 m) e Arestal (830 m), são conhecidas como “as Montanhas Mágicas”.
Na região, tem mais quatro montanhas que ultrapassam os mil metros de altitude, a Serra de Bigorne (1210 m), a Serra da Gralheira (1116), a Serra da Coelheira (1053 m) e a Serra de São Macário (1052 m).
Serra do Caramulo (1076 m)
Na mesma região, pode também visitar a Serra do Caramulo, conhecida pela qualidade das suas águas e pela pureza do seu ar, que levou a que fossem lá instalados inúmeros sanatórios nas décadas críticas da tuberculose em Portugal, tornando-se numa das mais afamadas estâncias sanatoriais da Península Ibérica. O seu ponto mais elevado é o Caramulinho (1076 m), de onde se pode avistar o mar nos dias de céu limpo.
Existe um percurso pedestre, denominado Grande Rota do Caramulo, que arranca do Museu do Caramulo e atravessa campos, florestas, aldeias típicas com espigueiros de granito, lagoas e cascatas, culminando numa subida ao Caramulinho. São 25 quilómetros de trilho que exigem alguma preparação física, por isso aconselham-se alguns treinos antes de enveredar nesta aventura.
BEIRA BAIXA
Serra da Gardunha (1227 m)
A Gardunha é considerada a montanha mais misteriosa de Portugal. Nas suas aldeias, ainda hoje se contam histórias à lareira sobre fenómenos paranormais que lá ocorrem, desde luzes estranhas que rasgam os céus noturnos a seres sobrenaturais que são por lá avistados. Os entusiastas da Ovnilogia garantem que este é o local do país com maior atividade de objetos voadores não identificados. Para alguns habitantes locais, as “luzes no céu” são já um detalhe quotidiano. Estes relatos de acontecimentos estranhos estão tão enraízados no imaginário popular que foi até criado o Gardunha Fest, um festival anual de curtas-metragens dedicadas à temática paranormal, organizado pela Histérico – Associação de Artes.
Numa das edições foi até organizada uma caminhada até um dos pontos mais altos da montanha, a Penha (1150 m), onde existe uma gruta – apelidada de “cosmódromo” – que dá abrigo a inúmeros relatos e ocorrências misteriosas.
À parte disto, a Gardunha é reconhecida pela sua natureza em estado puro, está integrada na reserva natural Rede Natura 2000 e no Geopark Naturtejo; pelas suas famosas cerejas; pelo seu evento anual “Chocalhos: Festival dos Caminhos da Transumância”; por ser um destino ímpar para a prática do parapente e asa-delta; entre muitos outros motivos. Mas é difícil resistir ao encantamento do seu apelo misterioso, não é?
Serra da Malcata (1072 m)
Na região pode também visitar a Reserva Natural da Serra da Malcata, criada como um santuário natural para o lince-ibérico (Lynx Pardinus), espécie endémica da Península Ibérica em perigo de extinção. Embora seja improvável avistar por lá um lince-ibérico nos dias que correm – não são avistados há muitos anos – está prevista a reintrodução da espécie no local no futuro. No entanto, a fauna da Reserva Natural é muito diversificada. Poderá cruzar-se com gatos-bravos, raposas-vermelhas, ginetas, esquilos-vermelhos, corços, javalis, cegonhas-pretas e abutres-negros.
REGIÃO DE AVEIRO
Serra do Arestal (830 m)
É uma das “montanhas mágicas”, onde as lendas e as histórias acompanham enigmáticas gravuras de arte rupestre, monumentos megalíticos e cascatas impressionantes, envolvidas por vegetação luxuriante. No alto do Arestal, a 830 metros de altitude, avistam-se paisagens extraordinárias, que vão do litoral, de Espinho até à Serra da Boa Viagem, ao interior montanhoso, da serra de Montemuro até à Serra da Estrela.
No topo da serra nascem dois rios de montanha, o Rio Bom e o Rio Fílveda, que dão origem a duas imponentes cascatas que, seguramente, merecem a sua visita: a cascata da Cabreia e a cascata da Fílveda.
Talhadas (675 m)
Perto de Sever do Vouga há uma terra chamada Talhadas. O nome, reza a lenda, deve-se a dois enormes penedos que rebolaram pela montanha abaixo durante uma noite de tempestade. Partiram-se em dois e ainda hoje estão lá, atravessados pela estrada junto à povoação. No alto da serra das Talhadas (675 m) – miradouro de Santa Maria da Serra – é possível, nos dias de céu limpo, avistar a costa lagunar de Aveiro.
Esta terra é muitas vezes apelidada de “museu arqueológico a céu aberto”, pois está recheada de monumentos megalíticos, destacando-se a Necrópole Megalítica de Chão Redondo, a Anta da Capela dos Mouros, a Anta da Sepultura do Rei e a Anta do Poço dos Mouros.
Está também condimentada com imensas lendas dos tempos da ocupação árabe. Contam que o “Penedo do Trigo” estará cheio de trigo, fruto de um antigo encantamento mouro. Já o “Penedo da Fazenda” estará cheio de tesouros que ali permanecem ocultos desde a partida do povo árabe.
Nas proximidades é possível aceder ao troço da Via Romana da Ereira, uma importante via que partia de Viseu e tinha ligação à via principal que unia Olisipo (Lisboa) a Bracara Augusta (Braga). Percorra as suas lajes de granito e imagine as legiões que por lá terão marchado na antiguidade.
REGIÃO DE LEIRIA E MÉDIO TEJO
Serra de Aire (679 m)
A Serra de Aire integra a cordilheira Montejunto-Estrela, que atravessa Portugal na diagonal, de sudoeste para nordeste. O seu ponto mais elevado é o Pico de Aire, com 679 metros de altitude, onde existe uma torre de observação florestal.
Embora a vista para as montanhas e para os vales seja memorável, é debaixo de terra que se encontram algumas das atrações extraordinárias deste território. A serra, que integra o Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros, está repleta de grutas naturais. As Grutas de Mira de Aire são as maiores grutas turísticas do país, um mundo à parte de galerias, estalagmites e estalactites, a 110 metros de profundidade e com 600 metros para percorrer entre os 11 quilómetros de extensão das grutas.
Se pretender fazer espeleologia e aventurar-se numa exploração em maior liberdade de uma gruta, é possível fazê-lo na Gruta da Nascente do Almonda, onde o CIGA – Centro de Interpretação das Grutas do Almonda organiza atividades que incluem a introdução à espeleologia, técnicas de progressão e uso de equipamento, e mergulho subterrâneo.
Não vá embora sem visitar o Monumento Natural das Pegadas de Dinossauros da Serra de Aire, onde vai encontrar os maiores, mais antigos e mais nítidos trilhos de saurópodes de que há conhecimento, reunindo mais de mil pegadas.
OESTE
Montejunto (666 m)
Chamam-lhe a “varanda da Extremadura”. E se subirmos lá a cima, percebemos porquê. No cume da Serra de Montejunto, a 666 metros de altitude, é possível avistar uma parte significativa da costa portuguesa, de Sintra até à Nazaré.
Há inúmeros vestígios históricos de ocupação humana nesta montanha. Desde uma das mais extensas necrópoles neolíticas em gruta existentes na Europa (Algar de Bom Santo), aos vestígios de um castro (Castro de Pragança), às ruínas de um convento dominicano do século XIII. Estas últimas situam-se já perto do cume, onde também existem duas capelas (São João Baptista e Nossa Senhora das Neves).
Também no topo da serra, encontram-se as ruínas da antiga Real Fábrica do Gelo, onde durante os séculos XVIII e XIX eram “fabricados” os blocos de gelo que eram enviados para Lisboa, para o rei e a sua corte poderem usufruir de gelados e bebidas frescas durante o verão. Posteriormente chegou também a abastecer também os cafés mais chiques da capital, até entrar em declínio em meados do século XIX, com a invenção do frigorífico. São organizadas visitas guiadas onde é possível visitar os tanques onde a água era congelada, os silos onde o gelo era armazenado e conhecer em maior detalhe o árduo processo de transporte até ao Terreiro do Paço, em Lisboa.
Nessa aventura rumo às montanhas e aos céus estrelados do Centro, deixe-se inspirar pela nossa playlist.